sábado, junho 17, 2006

Designer considera projecto gráfico da Copa "constrangedor"

Erik Spiekermann, um dos designers gráficos mais respeitados da Alemanha, abomina as criações visuais para a Copa do Mundo, da mascote ao logo. Ele explica o porquê, à DW-WORLD.


DW-WORLD: O senhor tem criticado muito a mascote da Copa, Goleo. Porquê ?

Erik Spiekermann: Não apenas a mascote, mas tudo. A mascote em si é um típico esforço para agradar gregos e troianos. É um leão, sem relevância histórica alguma para a Alemanha. Temos águias, gnomos, anões de jardim, e o que mais for, mas não temos leões. Isso é Inglaterra, ou França. O mascote é chamado Goleo, de "gol", como na palavra espanhola, e "leo", leão em italiano, latim e espanhol. Então, obviamente, tenta apelar para uma audiência mundial, o que é interessante, mas um tanto paternalizante. Por que não estar na Alemanha e chamá-lo "Fritz", ou o que seja? Já que somos alemães, então vamos assumir. Esse leão artificial não é nem bonito, nem feio, muito menos relevante. É simplesmente constrangedor.

DW-WORLD:Seria um caso de cozinheiros demais na cozinha do design?

Quando vi pela primeira vez tanto o leão quanto o logo, todo o conceito de design da Copa do Mundo na Alemanha, pensei "oh, meu Deus, esses pobres designers". Já estive nessa situação, lidei com esse tipo de cliente. Conheci, inclusive, alguns dos designers que perpetraram esse design, e sei que estavam em desvantagem desde o início. Todo o mundo quer ter o seu dedo no design de um evento mundial como esse, do presidente da empresa à sua esposa, continuando por toda a cadeia hierárquica abaixo, e há muitos comitês, reuniões, onde gente que não sabe o que está fazendo exige mudanças. No fim, o denominador comum acaba sendo muito, muito baixo. Eu jamais contrataria nenhum dos responsáveis por esse design.

DW-WORLD:Por que acha que o conceito todo não funciona, especialmente no que diz respeito ao logo?

Primeiro, há mensagens demais. A idéia original era: temos que incluir a Alemanha, 2006, a Fifa, além disso, tem que haver umas pessoas alegres, precisamos do verde da grama, temos as cores nacionais da Alemanha. Então tem verde, preto, vermelho e amarelo e as caras felizes e a Fifa, simplesmente mensagens demais. Basta olhar o logo e contar a quantidade de elementos, tudo isso é contra a comunicação eficiente.

DW-WORLD: A Alemanha fez melhor no passado?

Sim. Há o exemplo óbvio: o logo dos Jogos Olímpicos de 1972. Basicamente, era o outro lado do design alemão. Foi criado por um grupo ao redor de Otl Aicher, um dos pais da velha escola, dentro da tradição germânica, protestante, da Bauhaus. Era bastante rígido, mas deram um jeito de realizá-lo em cores pastel, leves, o que fez o design parecer alemão, no sentido de ser limpo e arrumado, mas ao mesmo tempo, claro e alegre.


Até mesmo o mascote, um cachorrinho "salsicha", um dachshund, não podia ser mais alemão. Foi criado ao longo de alguns anos pelos melhores da época. Mas esses caras de Munique, da Copa deste ano, só foram escolhidos por conhecerem alguém do alto escalão da Federação Alemã de Futebol e da Fifa. Isso nos dá uma má reputação.

DW-WORLD:Por que os designers da Copa evitaram parecer "alemães" demais?

Em parte, por termos essa incrível cruz a carregar. Você não pode se orgulhar de ser alemão, pois temos uma história tão negativa. Pelo menos a minha geração não pode, e nasci em 1947. Os clientes deste caso específico são da minha geração ou mais velhos, então acho que estavam tentando dar ao mundo tudo num pacote, e ao mesmo tempo ser alegres. É como desenhar uma piada, e não se pode desenhar uma piada. Acho que o conceito original da encomenda era um caos só. Com todas as coisas a serem evitadas, e o que se queria incluir, era impossível desenvolver algo bom. A não ser, é claro, que você fosse um designer de personalidade forte, que basicamente diria a essas pessoas dando as ordens para irem "se catar". O que os designers em questão não fizeram: eles apenas pegaram o dinheiro e saíram correndo.


DW-WORLD:A Copa do Mundo é sobre futebol, antes de mais nada. Qual é a importância do design nesse contexto?

Ele tem uma função direta, diz a você aonde ir, o orienta para sua meta, telões, estádios, muitas outras coisas. Ele diz às pessoas: "Essa mensagem se refere à Copa do Mundo". É como qualquer design para uma locação ou evento: você quer que as pessoas tomem consciência de sua presença. Uma vez dentro do sistema, o design lhes diz se estão no caminho certo, e indica o que está prestes a acontecer. Ele tem um papel funcional, mas também cria uma atmosfera, desempenha um papel psicológico.



Fonte:
Site DW-WORLD (Deutche Welle)